Meu Deus! Cada vez que lembro daquela casa sinto os meus nervos se atrofiarem de medo. É sério! O medo que se apodera de mim quando me recordo daqueles tempos de infortúnio e trevas, causa-me certos transtornos mentais que ainda nos tempos atuais, mesmo que eu tente saber, jamais encontrarei explicação. Sei que muitos agora hão de duvidar de minhas palavras... aliás, nem peço que as absorvam como verdade, apenas quero que saibam que isto realmente aconteceu comigo e, antes que eu comece a relatar os fatos abaixo, peço-lhes apenas uma coisa: não queiram saber o que aconteceu, e expulsem essa história de seus pensamentos, pois não gostaria de saber que o que aconteceu comigo venha a acontecer com mais alguém.
A casa em questão situa-se em um pequeno vilarejo habitado por pouquíssimas famílias. Era a mais bela das mansões e, ainda, a que mais externava medo. A possibilidade de instalar-me ali e obter sossego e paz foi o que me despertou atenção e ânsia em comprá-la.
Sem preâmbulos, começarei a relatar os diabólicos fatos que me arrancam o sossego até os dias de hoje. Naquela noite a casa jazia em silêncio, e no quarto maior onde me instalei, um barulho estranho me atrapalhava o sono. Percebi que as paredes, assim que abri os olhos, estavam todas sujas de sangue e unhas invisíveis iam riscando a porta e o teto, causando-me arrepios nos dentes. Fechei os olhos. Tentei dormir. Era assustador! Na noite seguinte, enquanto pernoitava, outra coisa se apoderou daquele quarto. O sangue subitamente começou a escorrer pelas paredes como veias abertas. Tentei ignorar aquela visão e rapidamente me cobri de medo. Em outra noite ouvi gemidos e passos no quarto. Pensei estar delirando, mas, de súbito senti algo puxar minha perna. Deslizei pela cama como se alguma coisa estivesse realmente ali. Tentei me agarrar na cabeceira, mas não resisti. Gritei em busca de socorro. Mas quando caí de costas no chão percebi que não havia nada ali. Coloquei a mão na perna e senti algo. Liguei a luz e vi que ela estava lavada de sangue. Assustei-me e sai do quarto. Aturdido, desmaiei no corredor.
Não agüentando mais, comecei a pensar na possibilidade de escafeder-me daquela maldita casa. Porém, alguma coisa não queria me deixar ir embora. Enquanto eu lavava a louça na pia certa noite, senti uma par de mãos me tocar as costas. Virei-me. Nada vi. Minutos depois, aquele mesmo par de mãos fez mergulhar minha cabeça na água dentro da pia. Comecei a me afogar e a me debater como um louco. Pensei que o demônio estivesse naquela casa. Mais tarde, enquanto deleitava-me no banho, outra coisa aconteceu. A água do chuveiro que eu saboreava, mudou-se da água para o vinho, ou melhor, da água para o... sangue! Sim, sangue! Trêmulo, saí do banheiro ainda com o corpo lambuzado. Fui até a cozinha, e lá chegando encontrei todas as gavetas e portinholas dos armários abertas. Respirei deficientemente e, antes de tentar fazer algo, corri até a porta que me levava para a rua. Porém, antes de chegar até ela, senti meu cabelo sendo puxado. Gritei de dor. Fui jogado no chão, e de repente algo fez a minha visão escurecer.
Dois dias depois eu estava decidido em ir embora daquele inferno. Preparei minhas malas e tentei partir. Enquanto eu atravessava a sala, olhei para o espelho e foi ai que vi um vulto negro no reflexo. Parei. Sentindo o sangue borbulhar e o frio comer-me as entranhas, corri para a porta, mas ela se fechou sozinha. Fiquei sem ação. Abri uma janela na sala e joguei as minhas coisas para fora, depois coloquei as mãos sobre o patamar e ia pular quando, de repente, ela fechou rapidamente sobre minhas mãos. O sangue jorrou dos meus dedos. Sem pensar, quebrei os vidros com a cabeça e, extraindo as mãos ensangüentadas que estavam presas, consegui pular.
Sai correndo estrada afora para nunca mais voltar.
Marcelo dos Santos
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